O que é a quimioterapia oral?
Última atualização em 5 de outubro de 2022
Muito desejado pelos oncologistas, esse tratamento promete oferecer uma melhor qualidade de vida para o paciente. Mas não pode ser usado por todos
Por Natália Mancini
Em 2020, os pacientes oncológicos passaram a escutar mais sobre a tal da quimioterapia oral. Isso aconteceu porque a quarentena evidenciou a dificuldade que algumas dessas pessoas enfrentam para realizar o tratamento. Já que elas poderiam ser contaminadas pelo novo vírus no caminho e alguns hospitais pararam de atender. Devido a possibilidade de utilizar esse tipo de terapia, surgiram muitas dúvidas sobre como a droga funciona, quais são os efeitos colaterais e cuidados necessários.
Antes de entender sobre o mecanismo de funcionamento desse tratamento, vale a pena dar um passo para trás e saber como as células funcionam!
As células não se comunicam com as outras estruturas do corpo por meio de órgãos, mas sim por receptores de moléculas. Essas moléculas são responsáveis por estimular ou bloquear certas funções que as células realizam. Isso é conhecido como modelo chave-fechadura, já que uma estrutura “encaixa” na outra para que algo possa acontecer.
Um exemplo, são os hormônios, pois eles são moléculas que estimulam as células. Como é o caso da testosterona, que é produzida nos testículos dos homens, cai na corrente sanguínea e, ao chegar nos vasos sanguíneos do rosto, “gruda” nas células que estão no local. O encontro entre hormônio e célula desencadeia uma série de estímulos dentro da própria célula, que fazem com que o DNA produza uma proteína. A partir da proteína, o folículo piloso produz a barba.
“Assim como a produção de barba no rosto dos homens, toda comunicação entre as células ocorre da mesma forma. É dessa forma que as células sabem quando metabolizar uma medicação e produzir eventos elétricos para bater nosso coração”, conta o Dr. Manoel Carlos Leonardi de Azevedo Souza, membro do Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer e coordenador de Educação do Centro Oncológico BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Como a quimioterapia oral funciona?
O Dr. Manoel Leonardi ressalta que como a quantidade de interações entre as células e moléculas é muito grande, há uma alta probabilidade de acontecer um erro nas interações. Sendo que muitas doenças se originam desses erros, como é o caso de alguns tipos de câncer.
“A quimioterapia oral tem por função o bloqueio ou o estímulo de moléculas intracelulares responsáveis pela comunicação da célula com o meio ambiente. Ou seja, visa corrigir essas interações que não deveriam acontecer e não são corrigidas pela natureza de nosso organismo”, ele diz.
Isto é, diferentemente da quimio intravenosa que atinge todas as células que se multiplicam rapidamente, quimioterapia em comprimido afeta somente as interações que não aconteceram do jeito que deveriam. Então, na verdade, chamar esses tratamentos orais de quimioterapia não está certo, porque elas são, na verdade, um tipo de terapia-alvo.
Assim como qualquer terapia-alvo, para que o antineoplásico oral funcione é preciso ter, cientificamente, identificado qual mutação genética causou aquele câncer – em outras palavras, em qual interação aconteceu o erro. Tendo essa informação, é preciso saber como impedir que o erro continue acontecendo. Criando, dessa forma, o medicamento.
“Uma vez que a droga-alvo impede que o principal mecanismo funcione, ela tem a capacidade ímpar de combater o câncer”, explica o doutor. Ele ressalta que, por isso, somente alguns tipos de cânceres podem ser tratados com essa técnica. “Certos tipos de câncer de pulmão, câncer de tireoide, câncer de rim, câncer de fígado, câncer de mama, melanoma e câncer de ovário. ”
Quimio oral x intravenosa
Além da forma de administração – a intravenosa é feita por meio de cateter e a oral por comprimidos – a velocidade de resposta do paciente também pode ser diferente, dependendo do tratamento. Apesar disso, os efeitos colaterais são semelhantes.
A primeira vantagem é que não é preciso se deslocar até o centro de tratamento para realizar a terapia. O medicamento, em comprimido, permite que o próprio paciente faça o uso em casa seguindo as orientações médicas.
“O uso do comprimido é mais fácil e simples do que todo o processo necessário para a aplicação da quimioterapia”, o Dr. Leonardi fala.
A segunda, é a rápida eficiência que as terapias-alvo produzem contra o câncer. Consequentemente, o paciente responde mais rapidamente ao tratamento.
Entretanto, da mesma forma que os comprimidos podem levar ao controle mais rápido do tumor, realizar o tratamento dessa maneira apresenta uma chance maior de recidiva. Isso acontece porque a célula doente pode criar mecanismos de resistência às drogas criadas para atacar o alvo.
“Por isso, é comum que usemos drogas-alvo em combinação com outras drogas-alvo ou em combinação com outro tipo de terapia. Como a imunoterapia”, o médico informa.
Já em relação aos efeitos colaterais da quimioterapia oral os mais comuns são: náuseas, vômitos, períodos de baixa imunidade, diarreia e febre. Porém, os sintomas podem variar de remédio para remédio, então é sempre importante avisar o oncologista de qualquer reação após o início do uso da medicação oral.
Todo paciente que usa droga-alvo em seu tratamento deve ser orientado adequadamente pelo seu médico e equipe multidisciplinar em relação à prevenção de reações adversas e o que pode ser feito, em casa, se os efeitos indesejados aparecerem.
Crianças podem usar a quimio oral?
“Sim, pacientes pediátricos podem utilizar drogas alvo no tratamento dos tumores. A indicação é feita pelo oncologista pediátrico e seu seguimento por toda equipe médica e multidisciplinar”, diz o especialista.
Ele salienta, porém, que no caso dos cânceres infantis é preciso fazer um acompanhamento mais de perto. Assim, é possível agir mais rapidamente caso os efeitos colaterais apareçam e fazer uma melhor manutenção da frequência correta do uso das medicações.
Com a quimioterapia oral cai o cabelo?
Há medicamentos que podem causar a queda do cabelo do paciente. Porém, outros, podem causar um crescimento acelerado dos cílios ou até mudar a cor do cabelo. Mas, também existem aqueles que não interferem nessa questão.
Quando acontece a alopecia, não é indicado fazer o uso da touca inglesa, pois ela não seria eficiente. De acordo com o Dr. Leonardi, “a maneira de ação das drogas orais é diferente da quimioterapia endovenosa. Consequentemente, a queda de cabelo ou efeitos sobre os cabelos ocorre por outros mecanismos. Assim, o uso da touca gelada não está indicado para controle da queda dos cabelos com uso de drogas orais. ”
Não consigo tomar a quimioterapia oral inteira. O que fazer?
Alguns quimioterápicos em cápsula ou comprimido devem, preferencialmente, ser tomados inteiros. Isso acontece porque pode ser necessário evitar o contato manual com o quimioterápico. Além disso, o formato em cápsula faz com que o medicamento seja absorvido somente em um certo local do organismo. Então, diluir pode acabar prejudicando o efeito e resultado esperado.
“Em algumas situações, o paciente pode não conseguir engolir comprimidos ou cápsulas devido ao tamanho do mesmo ou por outros motivos. Nesses casos, deve-se consultar o farmacêutico para que ele pesquise na literatura disponível e verifique a possibilidade de diluição”, orienta Mayde Torriani, diretora da Sobrafo e farmacêutica do ambulatório do HC de Porto Alegre.
O que fazer se esquecer de tomar uma dose?
O primeiro passo é conversar com o farmacêutico da equipe multidisciplinar ou com o médico responsável por acompanhar o tratamento. Pode ser que o paciente seja orientado a tomar a dose atrasada e, no dia seguinte, voltar a tomar corretamente. Outra possível solução é pular a dose esquecida e só tomar a próxima.
“De forma alguma deve dobrar a próxima dose sob risco de aumentar os possíveis efeitos adversos relativos ao quimioterápico”, Mayde alerta.
O Dr. Manoel Leonardi adverte sobre a necessidade de fazer o uso adequado e nos horários indicados. Apesar de esquecer uma ou duas doses não prejudicar o resultado final, o efeito das medicações utilizadas corretamente é melhor.
Devo tomar a quimioterapia oral em jejum?
“Cada tratamento com quimioterápicos orais tem as suas peculiaridades. Alguns fármacos têm sua absorção favorecida pela presença de alimentos outros podem ter a absorção prejudicada. Ou ainda, para amenizar efeitos gastrointestinais provocados pela quimioterapia, orienta-se tomá-la junto a alguma refeição”, a farmacêutica conta.
Por isso, é muito importante que o paciente sempre fale com os profissionais responsáveis para ter as informações corretas. Além disso, é preciso verificar se há alguma restrição em relação à alimentação, pois a interação medicamentosa pode deixar o medicamento mais forte ou mais fraco.
Segundo Mayde, “são poucos os quimioterápicos orais que apresentam interações medicamentosas com alimentos, mas existem. ”
Como devo armazenar o medicamento?
É preciso ter cuidado com os medicamentos que necessitam estar constantemente em refrigeração.
No dia de retirar o tratamento na farmácia, deve-se levar uma caixa térmica com gelo artificial reutilizável rígido. Como gelo-x ou termogel. Dessa forma, é possível garantir a temperatura adequada durante o transporte.
“Ao chegar em casa, retirar da caixa térmica e guardar no refrigerador. Evitar colocar na porta do refrigerador, dentro ou próximo do congelador ou no freezer. Preferencialmente, colocar no fundo do refrigerador, na prateleira próxima da gaveta das verduras. Se puder, coloque dentro de uma caixa plástica com tampa para proteger a embalagem de possíveis acidentes, como derramamento de algum líquido em cima”, a farmacêutica indica.
Se faltar luz, é preciso ficar atento a quanto tempo ela demora para voltar. Caso a temperatura interna do refrigerador comece a subir, é preciso retirar o medicamento e colocá-lo em uma caixa térmica com o gelo artificial.
Já para os medicamentos que podem ficar em temperatura ambiente, o recomendado é que eles sejam guardados em locais sem umidade e protegidos da luz. Para evitar confundir com outros remédios, o ideal é que ele fique em algum lugar separado.
O que fazer se alguém ou um animal de estimação ingerir acidentalmente o quimioterápico oral?
“Verifique a quantidade provável de comprimidos ingeridos e leve o animal de estimação imediatamente para atendimento veterinário. Leve junto a bula e outros informativos que tenha em casa sobre o seu medicamento. O veterinário poderá consultar o órgão de informações toxicológicas da vigilância sanitária do seu estado para obter informações”, Mayde explica.
Pacientes que utilizam fraldas, como deve ser feita a manipulação e o descarte adequado?
A farmacêutica diz que “muitos medicamentos quimioterápicos são eliminados por meio da urina e das fezes na forma inalterada ou como metabólitos. As fraldas dos pacientes em tratamento com quimioterapia oral devem ser trocadas e/ou manipuladas com luvas pelo familiar ou cuidador. ”
Como, no Brasil, não há legislação definida sobre o descarte de fraldas de pacientes em tratamento quimioterápico, elas devem ser jogadas no lixo comum.
O que a Lei brasileira diz sobre o acesso à quimioterapia oral?
Em junho de 2020, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei (PL) 6.330/2019, que prevê que os planos de saúde devem oferecer a terapia oral imediatamente após a Anvisa regulamentá-la.
O PL foi aprovado na Câmara dos Deputados em 01 de julho de 2021 e no Congresso Nacional no dia 23 do mesmo mês. Porém, quando chegou para a sanção do Presidente Jair Bolsonaro, a Presidência da República vetou o PL. Dessa forma, o projeto retornou ao Congresso Nacional, que tem o prazo de 30 dias corridos para decisão de manter o veto, ou não, pelos senadores e deputados em sessão conjunta.
Também neste ano foi protocolado o PL 3406/20, que visa garantir que os pacientes que utilizam o Sistema Único de Saúde também tenham acesso à quimioterapia oral assim que a droga for aprovada pela Anvisa. Esse projeto ainda aguarda para ser votado.
O que a mutação genética significa para um câncer
Se surgirem efeitos colaterais ao medicamento
Foi suspenso o uso do medicamento, posso devolver? eles podem utilizar para outro paciente?
Olá, Solange, como vai?
Isso depende de cada centro de tratamento. Porém, a senhora pode tentar devolvê-los e o centro verifica como proceder ou a senhora pode procurar se algum paciente necessita de doação (uma possibilidade é procurar em alguns grupos do facebook ou afins). Qual medicamento a senhora utilizava?
Abraços!
Olá boa tarde, provavelmente minha mãe irá precisar do medicamento via oral. Ela irá fazer alguns exames para ver a necessidade e a técnica que será implementada como complemento, pois já realizou a cirurgia.
Olá, Andressa, como vai?
Após esses exames, o(a) médico(a) responsável irá indicar qual a quimio oral indicada para o caso dela e também irá orientar como conseguir o medicamento.
Ela fará o tratamento para qual tipo de câncer?
Abraços!
Gostaria de saber se quem fez bariatrica pode usar quimioterapia oral?
Olá, Caio, como vai?
Nós desconhecemos que haja alguma proibição da utilização da quimio oral nesses casos. Mas, é preciso entender com o médico 1) se a bariátrica poderia interferir na absorção do medicamento, alterando sua eficácia e 2) se há alguma quimioterapia oral desenvolvida para aquele tipo específico de câncer.
Abraços!
Ola minha mae toma a quimioterapia oral a meses recem, ela tem câncer de mama e agora a medica pediu uma ultravaginal. Devo me preocupar?
Olá, Jenifer, como vai?
Não, necessariamente. Nós indicamos que ela ou a senhora conversem com a médica para entender certinho o porquê de ter pedido esse exame. Às vezes, pode ser só para fazer um acompanhamento mais geral.
Abraços!
Meu cunhado está fazer comprimido quimioterápico para combater a evolução de um tumor no cérebro, por quanto tempo ele o poderá tomar ? Tem um período máximo ou poderá ser por anos ?
Olá, Paulo, como vai?
O tempo depende muito de paciente para paciente, em alguns casos, o tratamento pode ser mais curto, mas em outros pode levar mais anos. O oncologista pode dizer certinho por quanto tempo ele terá que fazer uso desse medicamento, de acordo com as características da doença e do quadro de saúde do paciente. Mas, é muito importante que qualquer efeito colateral que seu cunhado apresentar, ele relate ao médico, para que eles possam ir ajustando a terapia.
Abraços!
Olá. Minha mãe começou hoje a fazer a radioterapia com a ” quimio oral”. Minha dúvida é se esse tratamento tem a mesma eficiencia da quimio tradicional a venosa? O câncer originou na vesícula e foi para o fígado, fez cirurgia de retirada da vesícula e boa parte do fígado, ele se regenerou mas voltou agora com um tamanho pequeno.
Complementando: o fígado cresceu normal, mas também voltou um tumor pequeno no orgão
Faço uso de anastrozol e palbociclibe há 2 semanas e desde então meu cabelo está caindo muito. Existe alguma coisa que posso fazer para diminuir ou cessar essa queda?
Olá, Alessandra, como vai?
A queda de cabelo é um efeito colateral que pode acontecer nos dois medicamentos. O ideal é que a senhora converse com o(a) médico(a) que está acompanhando o seu tratamento, para que ele(a) te oriente se há algo que possa ser feito para reduzir essa reação.
Abraços!
Obrigada