Sophia e o Projeto Dodói
Última atualização em 7 de dezembro de 2021
Como o projeto que faz 15 anos muda a vida dela e de tantas outras crianças com câncer
O Projeto Dodói é uma parceria da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (ABRALE) com o Instituto Mauricio de Sousa, uma iniciativa que já capacitou mais de 200 profissionais e atendeu a pelo menos cinco mil crianças em 40 hospitais envolvidos. A ação foi criada e desenvolvida pela equipe ABRALE, com importante atuação da psicóloga Heloísa Chiattone, no ano de 2005. O projeto distribui kits com bonecos da Turma da Mônica e uma malinha com instrumentos médicos lúdicos, entre outros itens.
A ideia central é humanizar a relação do profissional de saúde com o paciente, bem como tornar menos pesado o processo de enfrentamento da doença para crianças e seus familiares. “Os bonecos e seus kits foram desenvolvidos com base em justificativas científicas de todas as áreas da Saúde. Nós, da ABRALE, esperamos que esses kits sejam utilizados pelas crianças e pelos profissionais da multidisciplina. Temos certeza de que, dessa forma, faremos a diferença na vida de todos os envolvidos na luta contra as doenças oncopediátricas”, diz Melissa Abreu Pereira, gerente de apoio ao paciente da ABRALE.
Segundo ela, o diagnóstico de uma doença e a necessidade de hospitalização na infância provocam repercussões psicossociais importantes e intensas na vida da criança. “Isso provoca sentimento de aniquilamento e mutilação, incremento da angústia de morte, sensação de punição, perda de autonomia e liberdade, regressão, dependência, passividade e sentimento de impotência”, explica Melissa. “Sendo assim, é essencial que as crianças internadas em enfermarias pediátricas ou tratadas em ambulatórios possam participar de atividades lúdicas programadas, dirigidas por profissionais de saúde. Por meio do brincar elas poderão experimentar uma nova forma de ser”.
Brincar de tratar o câncer torna menos pesado o enfrentamento da doença
Para Fabiana Cristina Datri, psicóloga do GPACI, de Sorocaba (SP), o Projeto Dodói foi implantado com o intuito de ajudar no processo de hospitalização de crianças de três a 14 anos de idade com diagnóstico oncológico e que passam muito tempo do tratamento longe dos amigos, da escola e da família. Ou seja, elas necessitam de uma interação que tanto torne mais amigável os procedimentos invasivos, como crie um melhor vínculo da criança com a equipe de saúde. “O kit vem com o Cebolinha ou a Mônica, que a criança escolhe, e uma mochila com kit médico, gibi, livro de orientações sobre câncer, jogos e contação de histórias”, diz Fabiana Datri. “Esse projeto é um facilitador no tratamento oncológico e o intuito é que, através do lúdico, a criança possa expressar seus sentimentos e faça do momento da hospitalização um ambiente mais agradável. Com o kit, as crianças conseguem lidar melhor com o tratamento, principalmente com os procedimentos invasivos”.
O boneco da Turma da Mônica com a parceria do Instituto Mauricio de Sousa tem uma importância fundamental, já que o paciente tem nele o melhor amigo, que o acompanha em todos os procedimentos. Para Sandra Dias, enfermeira do Hospital Darcy Vargas, de São Paulo (SP), o Projeto Dodói é um facilitador da interação e comunicação entre criança, família e profissionais de saúde. “A gente compila brinquedos, livros, cartilhas, guias e jogos para amenizar as dores física, psíquica, social e espiritual da criança. Com os brinquedos aliados à imaginação, ela pode suportar as mudanças nessa rotina hospitalar, eles proporcionam momentos lúdicos que ajudam a construir um elo, a interpretar e expressar o que estão sentindo”, diz Sandra Dias. Com a pandemia, os hospitais estão sem poder receber voluntários, palhaços, cachorros, contadores de histórias, entre outros. Nesse momento, o Dodói se tornou um trunfo importante para entreter as crianças.
Objetivos do Projeto Dodói
>Prepara emocionalmente a criança para o tratamento oncológico hospitalar
> Favorece o bem-estar emocional, físico e mental da criança durante o tratamento
> Facilita a comunicação da criança com familiares ou cuidadores e com a equipe de saúde
> Integra a criança e sua família ao ambiente hospitalar
> Ameniza o sofrimento
> Informa, de maneira lúdica, por meio de material desenvolvido especificamente para o projeto, o que são a doença e seus desdobramentos, quais os efeitos do tratamento, o que vai acontecer no hospital, entre outros
A voz da enfermagem
Com o kit Dodói, o projeto consegue fazer com que a criança compreenda o que vai acontecer com ela no procedimento. Assim, garante mais tranquilidade para paciente, pais e equipe, na realização e sucesso do tratamento. “Por exemplo, ao realizar um acesso venal, aproveitamos para explicar para a criança o que vai acontecer, instruindo que ela faça no boneco tudo o que faremos com ela na sequência. Ensinamos que o boneco deve ficar quietinho, respirar fundo, entre outros pontos, aliamos o brincar – algo natural da fase – com o momento de vida – dolorido, em que brincar deve ser permitido, estimulado e zelado. E é sem erro: após oferecer à criança a oportunidade de realizar na Mônica ou no Cebolinha uma ação, além de compreender o que vai ocorrer, ela cria também a consciência do ‘cuidar’, que ela não é furada, porque queremos e, sim, para seu próprio bem. Assim minimizamos o estresse, o choro e a até a raiva”, explica Sandra. “Com o preparo da criança para os procedimentos, ela se torna mais segura e confiante, aderindo melhor ao tratamento. A criança é um ser ativo e deve ser considerada de forma integral, sendo envolvida e compreendendo sua nova rotina e o motivo de cada ação a que é submetida. Pelo kit do projeto, contemplar diferentes itens faz com que alcancemos idades distintas – tem jogos, brinquedos, gibis, cartilhas. Conseguimos integrar os pais nessas brincadeiras, aproximando a família, assim como também podemos observar o comportamento do paciente e compreender sentimentos, anseios e desejos.
Benefícios psicológicos do Projeto Dodói
A psicóloga Iolanda Galvão trabalha no Hospital Onco-Pediátrico Erasto Gaertner, de Curitiba, mais conhecido como Erastinho. Responsável pela Pediatria, ela diz que começou a aplicar o Projeto Dodói, em 2017, com uma grata satisfação de pacientes e familiares. “O projeto dá à criança a possibilidade de sair do lugar de paciente e ocupar o lugar de cuidador. Ela pode examinar os bonecos com o instrumental lúdico que faz parte do kit. No fim, a Mônica ou o Cebolinha se tornam pacientes da criança”, explica Iolanda Galvão.
Na prática, isso ajuda em um processo de catarse. “A criança pode examinar o boneco e desmistificar aqueles exames que os médicos fazem nela. Isso acaba desconstruindo um pouco o próprio ‘pavor’ que a criança eventualmente tem diante de um procedimento”, acrescenta a psicóloga.
Para os pais, os benefícios vêm das cartilhas que acompanham o kit, que falam das neoplasias mais comuns na infância, usando uma linguagem muito clara. “Na prática, eles podem ser os multiplicadores, transmitindo essas informações para outras pessoas de seu convívio. Ou seja, nesse projeto, o benefício não fica restrito ao hospital, ele pode ser um objeto de multiplicação de informações”, diz Iolanda.
“Hoje ela fala ‘doencinha’, que ela vai ficar boa”
Cristiane Espósito é mãe da Sophia Espósito. Ela tem 5 anos e trata LLA no Hospital Sabará/SP
“O Projeto Dodói foi muito importante para a Sophia porque ela se identificou com a Maria, que é a personagem do Projeto com leucemia. Quando viu que tinha uma amiguinha com a mesma doença, ela começou a falar isso para as amiguinhas dela. Explicou que tinha a mesma doença da Maria, personagem do Projeto Dodói, que o Mauricio de Sousa desenvolveu. E que foi fazer fotos para divulgar esse trabalho que a Maria fazia. Quando ela se viu nas reportagens, começou a entender um pouco mais dessa doencinha que ela tem. Ela fala ‘doencinha’, que ela vai ficar boa, vai ser curada, com fé em Deus. E que muitos amiguinhos que têm essa doencinha também vão ficar curados. A personagem Maria estimulou Sophia a entender que outras crianças também têm essa doencinha. E que a gente precisa pedir ajuda a Deus, não só por ela, mas por todas. Isso é muito bonito para a criança entender. Um projeto que pode ajudar outras crianças que também precisam de um tratamento, de hospitais, de médicos.”
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