Mediação: conversando a gente se entende
Última atualização em 29 de julho de 2021
Problemas no hospital, no SUS ou no plano de saúde? Você pode resolvê-los, por meio da mediação, sem precisar entrar na justiça
Problemas no hospital, no SUS ou no plano de saúde? Você pode resolvê-los, por meio da mediação, sem precisar entrar na justiça
A mediação é um método de prevenção de conflitos que busca resolver problemas de maneira mais simples e eficiente, antes que virem um caso de Justiça. Ela vale para todos os campos da atividade humana, mas se mostra particularmente desejável na área da Saúde. Afinal, é uma ferramenta que torna a comunicação mais clara e adequada entre as pessoas envolvidas no processo. Isso permite que as partes se antecipem a desentendimentos evitáveis.
O advogado Fernando Guilhon trabalha com mediação na área de saúde há quase uma década. Ele é professor de Mediação na Universidade Federal de Juiz de Fora e mediador internacional, além de participar de um projeto pioneiro na Santa Casa de Juiz de Fora, onde equipes recebem treinamento de mediação. Já viu de tudo em hospitais. Explica que as pessoas estão com os nervos à flor da pele e precisam de uma atenção especial antes que percam a cabeça e tomem decisões precipitadas. No caso de aprovação de tratamentos, a mediação deve se tornar, em breve, a principal ferramenta para solução de problemas burocráticos.
Mediação é um método de prevenção de conflitos que busca resolver problemas de maneira mais simples e eficiente
De acordo com Guilhon, o conceito de mediação ganha cada vez mais espaço no mundo, principalmente na Europa. Nos Estados Unidos, existe há 40 anos. “A estratégia é treinar aqueles que têm contato com o paciente e as famílias. O enfermeiro, o atendente da recepção, o segurança, o pessoal da faxina, o motorista de ambulância, o médico, o gerente, o diretor. Enfim, todos têm de estar prontos para oferecer um meio mais humano para resolver conflitos, sem efeitos colaterais, para usar um jargão da medicina”, explica. “Em resumo, estamos falando de um tratamento mais gentil, eficiente e atencioso”.
O mediador precisa ter a sensibilidade de ler por trás das falas
No Brasil, a medição ainda engatinha. Mas, passo a passo, chegaremos lá. “Mesmo nos melhores hospitais as pessoas simplesmente não conseguem resolver as coisas. E, às vezes, é só uma questão de explicar o que está havendo. O médico pode ser o principal especialista do mundo. Entretanto, se não entende as necessidades da família, se age sem empatia, pode criar problemas desnecessários”, alerta Guilhon. Apesar do atraso, a mediação deve se tornar realidade em breve no país, é uma tendência irreversível.
Os benefícios de solucionar conflitos de forma mais simples e prática e menos traumática e onerosa podem ser sentidos por ambas as partes. “Em certa ocasião, a família foi proibida de ver um paciente por determina- ção do médico. Mas era uma questão importante para eles, patrimonial. Sem saber do que se tratava, o hospital manteve-se intransigente. Resultado: a família acionou o Ministério Público e conseguiu falar com o paciente. Enquanto que o hospital acabou sendo processado e teve um grande prejuízo”, conta o mediador. “Nem sempre as in- tenções dos familiares de um paciente com uma doença grave são claras. Um mediador precisa ter a sensibilidade de ler por trás das falas. Muitas vezes, estão preocupados com questões materiais ou sentimentais e não dizem”.
Na Inglaterra, por exemplo, os hospitais começaram a fazer cálculos, revela Fernando Guilhon. Notaram que perdiam praticamente 100% das ações movidas por pacientes e familiares. Perceberam também, que o custo com mediação costumava ser até cinco vezes menor, se comparado ao da “judicialização”. Não demorou até que a cultura de mediação passasse a fazer parte da estratégia de comunicação corporativa de muitos hospitais.
Um caso clássico de mediação bem-sucedida aconteceu em um hospital oncológico de lá. O paciente era de outra cidade e o seu plano de saúde não cobria o atendimento ali. Mas era um quadro grave e não havia possibilidade de transferência do paciente. Diante da situação, a equipe de atendimento entrou em contato com o plano de saúde e conseguiu a promessa de um reembolso pelo tratamento por intermédio de outro hospital, o que acabou acontecendo. “A resposta padrão seria ‘não cobre e ponto’. Entretanto, o hospital tinha o treinamento de mediação e conseguiu resolver o impasse de uma maneira que ficou boa para todos. Até porque, se o hospital não resolvesse, corria o risco de ser processado e ficar com um grande prejuízo. Assim como o plano de saúde”, explica o advogado Fernando Guilhon.
A mediação traz benefícios para ambos os lados
Promovendo treinamentos da mediação, clínicas e hospitais criam uma relação cooperativa com aqueles com quem mantém relacionamentos de longo prazo, caso de pacientes, dos planos de saúde e do próprio SUS, aqui no Brasil. Assim, superando sem crises, conflitos com pacientes, acaba revertendo em novos pacientes e em fidelização. A marca também pode ser favorecida, principalmente se o processo correr em sigilo, evitando escândalos. Paralelamente, o nível de estresse e desgaste emocional das equipes diminuem, reduzindo também queda de eficiência e produtividade dos funcionários por problemas de saúde mental – situação que tem se mostra- do alarmante no mundo. Por fim, há o ganho financeiro, já que o custo da mediação é menor do que o da “judicialização”. “O êxito dos processos de mediação chega a 85%. Os 15% restantes são casos em que as pessoas transformam a questão em uma competição, e querem vencer”.
Para os pacientes e seus familiares, a principal vantagem da mediação, além de receberem um atendimento mais cuidadoso e terem sempre a quem recorrer em caso de conflitos, é que o processo de mediação tende a se resolver em até três meses, enquanto um processo judicial pode chegar a oito anos. É claro que a morosidade da Justiça pode induzir a parte mais fraca a aceitar acordos desvantajosos ou servir de instrumento da parte mais forte para postergar pagamentos, mas, com o avanço da cultura de mediação, isso tende a se tornar mais incomum.
No futuro, o que se espera é que os hospitais e centros de atendimento médico tenham em uma primeira etapa uma ouvidoria e, depois, evoluam para um centro de mediação, com todos os profissionais devidamente capacitados.
Quando acionar a justiça?
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No Brasil, a mediação ainda tem um longo caminho pela frente. Mesmo os grandes hospitais estão despreparados para atender a pacientes e familiares sob a égide da cultura de resolução de conflitos de maneira preventiva. Por isso, a busca por soluções via Justiça pode ser um caminho inevitável. “Na mediação, as pessoas resolvem o conflito sem um árbitro e negociam todos os detalhes. A vantagem é que a solução é rápida e consensual, mas pode não ser tão generosa. No processo judicial, quem decide o impasse é um terceiro ente, a Justiça. O problema é que um processo tem custo e tende a demorar, embora as chances de vitória sejam muito altas”, explica o advogado Fernando Guilhon.
O termômetro para se decidir por um processo judicial costuma ser a postura dos médicos e hospitais. “No caso de um erro médico, hospitais com experiência em mediação e com profissionais preparados para isso conseguem resolver o conflito sem precisar ir à Justiça. Mas nem sempre esse é o caso”, diz o advogado.
No caso da cobertura do plano de saúde e do próprio SUS, a situação pode ser mais delicada. Mas pessoas com doenças como o câncer têm direito ao tratamento de forma gratuita e para o resto da vida. Se isso não acontecer, a Justiça sempre pode ser acionada.
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